18 de abr. de 2013 | By: Fabrício

Maioridade Penal


Nas últimas semanas um dos grandes debates que voltou à tona em nossa sociedade e que ganhou destaque nos vários veículos de comunicação, foi a redução da maioridade penal. Questão esta que volta e meia ressurge quando acontece algum tipo de crime hediondo que envolva menores e que ganha destaque nacional.

O caso mais recente que chocou e comoveu grande parte de nossa sociedade foi a do estudante da Faculdade Cásper Líbero, Victor Hugo Deppman (de 19 anos) que foi morto na noite do dia 09/04/2013 com um tiro na cabeça durante um assalto em frente de seu prédio. Do assassino, não saberemos nem o nome. O Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) proíbe a divulgação. Ele era um menor por mais três dias apenas. Setenta e duas horas depois de matar Deppman, completou 18 anos. Tivesse já feito aniversário, saberíamos quem é ele e poderia ser processado por latrocínio — um crime hediondo. Como era um menor, ficará internado no máximo — isso quer dizer que pode sair antes — três anos. Sob nenhuma hipótese, continuará detido depois dos 21 anos. Saíra da Fundação Casa com a ficha limpa. E em meio a tal conjuntura que se configurou é que se discute novamente a diminuição da maioridade penal.

Ao meu entender a redução da maioridade penal não resultará em nada. Reduzir a maioridade penal é tratar o efeito, não a causa. É encarcerar mais cedo a população pobre jovem, apostando que ela não tem outro destino ou possibilidade. O que quero dizer é que sabemos que o nosso sistema penitenciário não recupera ninguém e isso vale também para a Fundação Casa (instituição que “cuida” de menores infratores no estado de São Paulo). Nosso sistema está falido, em virtude de não ter infraestrutura, dos reclusos viverem em um ambiente sub-humano devido às condições insalubres, com selas superlotadas e para completar, passam os dias na ociosidade. Tudo isso, faz que se crie um ambiente que não recupera e não ressocializa ninguém, formando assim um grande circulo vicioso, propício para o surgimento de rebeliões.

O aspecto que cabe destacar dos efeitos da prisão sobre os criminosos, é que ela da forma que está estruturada degrada por demais a personalidade do homem preso. Quase tudo que auxilia na destruição da dignidade humana, pode ser encontrado na prisão - humilhação, medo, violência, perda de referências pessoais. Sendo assim, sobre diversos aspectos, nosso sistema penitenciário representa a supressão dos direitos humanos. Percebe-se que o Sistema Penitenciário Brasileiro, por descaso dos poderes competentes, não consegue promover de forma precisa sua função de reintegrar o apenado à sociedade. Segundo levantamento feito a pedido da BBC Brasil pelo especialista Roy Wamsley, diretor do anuário online World Prison Brief (WPB), nas últimas duas décadas o ritmo de crescimento da população carcerária brasileira só foi superado pelo do Cambodja. Se a tendência de crescimento recente for mantida, em dois ou três anos a população carcerária brasileira tomará o posto de terceira maior do mundo em números absolutos da Rússia.

Fonte: Open University

Não podemos esquecer que 95% do contingente carcerário, ou seja, a sua esmagadora maioria, é oriunda da classe dos excluídos sociais, pobres, desempregados e analfabetos, que, de certa forma, na maioria das vezes, foram “empurrados” ao crime por não terem tido melhores oportunidades sociais. Há de se lembrar também que o preso que hoje sofre essas penúrias dentro do ambiente prisional será o cidadão que dentro em pouco, estará de volta ao convívio social, junto novamente ao seio dessa própria sociedade. Frente a tal constatação, a lei não é igual para todos. Foucault ao falar sobre o crime e a lei que o determina, diz que:

“… seria hipocrisia ou ingenuidade acreditar que a lei é feita para todo o mundo em nome de todo mundo; que é prudente reconhecer que ela é feita para alguns e se aplica a outros; que em princípio ela obriga a todos os cidadãos, mas se dirige principalmente às classes mais numerosas e menos esclarecidas; que, ao contrário do que acontece com as leis políticas ou civis, sua aplicação não se refere a todos da mesma forma; que, nos tribunais, não é a sociedade inteira que julga um dos seus membros, mas uma categoria social encarregada da ordem sanciona outra fadada à desordem (…)” (FOUCAULT, 1987, p. 208)

O que defendo – como medida imediatista – não é a redução da maioridade penal, mas sim que em casos de crimes hediondos, o “menor” seja julgado como um adulto independente de sua idade. Assim como acontece na Inglaterra e em alguns estados americanos. Entretanto, este tipo de punição é algo quase que inconcebível em nosso país, pois para haver esse tipo de pena, seria preciso alterar nosso Código Penal, nossa Constituição e ainda o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA). Logo se torna inviável em virtude de nossos legisladores serem omissos quando se trata fazer algum tipo de alteração nessas normas, visto que nosso Código Penal é de 1940.

É sabido que toda e qualquer punição dada ao infrator é considerada uma medida paliativa, pois se nosso sistema prisional e educacional (no caso de instituições para menores) não recupera ninguém, há uma grande probabilidade desse adulto ou menor voltar a cometer outro tipo de delito quando sair. Este é um fator que faz com que muitos se tornem reincidentes; e frente a isso é que não vejo nenhuma perspectiva de melhora ao reduzirmos a maioridade penal. Afinal, não há mais espaço para trancafiarmos tantas pessoas em nossos presídios. "Por mais esforço que o Estado faça, não dá conta de construir mais vagas no mesmo ritmo", admitiu o diretor do Departamento Penitenciário Nacional (Depen), do Ministério da Justiça, Augusto Rossini, em entrevista, quando se referia ao grande crescimento da população carcerária em nosso país que cresceu consideravelmente nas últimas décadas.

Mas o que fazer então? A resposta é investir em EDUCAÇÃO, para assim evitarmos que muitos desses menores ingressem para o mundo do crime. Só que ao se investir em educação, seu resultado se dará a longo prazo, algo em torno de dez anos, afirmam alguns dos especialistas mais otimistas. E enquanto esse investimento não é feito, temos que suportar as mazelas presente em nossa sociedade que convive diariamente em um ambiente de medo e pavor, na qual os menores são os protagonistas principais.


REFERÊNCIA:
FOUCAULT, Michel. Vigiar e Punir - História da Violência nas Prisões. Petrópolis: Vozes, 1987.

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