E este número é aproximado, dizendo respeito somente ao exército inglês. Pesquisadores revelam que tomando todos os lados envolvidos, esse número pode ser até duas vezes maior.
Historiadores calculam que mais do que 90% dos cavalos ingleses enviados para os campos de batalha na Primeira Guerra Mundial (1914-1918) nunca retornaram. Na época, embora já se empregasse carros e tanques, e boa parte da guerra tenha sido realizada em trincheiras, os animais ainda representavam uma das principais formas de locomoção em terreno de combate. Era a chamada “cavalaria”, considerada uma tropa rápida e eficaz de luta envolvendo soldados.
Soldados enterram cavalos mortos em batalhas na Primeira Guerra.
Mas os cavalos não serviram apenas para carregar os soldados: esses incríveis animais também foram vitais para o envio de mensagens, transporte de armas e suprimentos. No teatro de guerra, deste modo, os cavalos tinham um valor estratégico. E isso, claro, consumia recursos. Como passavam horas e até dias carregando grandes quantidades e peso, passando frio e calor, precisavam ser alimentados corretamente. Durante os quatro anos de campanha, o exército bri-tânico, por exemplo, precisou arcar com toneladas de alimentos.
De acordo com o site World War History Online, estima-se que até o fim da Primeira Guerra Mundial cerca de 8 milhões de cavalos tenham sido utilizados por ambos os lados envolvidos no conflito, além de 213 mil mulas. Haveria, no entanto, uma disputa a respeito do número de ani-mais que perderam suas vidas. Para os britânicos, dos quase 1 milhão de cavalos enviados ao front aliado, apenas 65.000 retornaram. A maioria teria morrido, mas muitos também se perde-ram ou simplesmente foram vendidos. É impossível determinar com exatidão o destino desses cavalos-soldados. Mas há espaço para algum heroísmo nisso tudo. Documentos encontrados no Ministério da Guerra, encontrados no Arquivo Nacional em New, revelam que dezenas de milhares de animais que corriam risco de morte após lutarem na guerra foram salvos graças a um ofício que Winston Churchill enviou para a sua própria secretaria de Estado de Guerra e par ao Ministério de Transporte. Em apenas uma semana, foram enviados de volta para Grã-Bretanha 21 mil cavalos.
Só os exércitos franceses utilizaram entre 1,5 milhão e 1,8 milhão de equinos, enquanto a Inglaterra levou para os campos de batalha outros 1,2 milhões e a Alemanha, 1 milhão. Os demais países, estimam historiadores, somavam 4 milhões de animais. Oitenta por cento dos cavalos franceses morreram em campo, 35% deles abatidos por tiros inimigos, destino parecido com os das demais tropas. A maior parte morria de fome e exaustão, sacrificada ou abandonada nas longas travessias entre os campos de batalha.
Em 1918, os poucos sobreviventes foram vendidos para os raros fazendeiros que tentavam retomar suas vidas. Os novos proprietários reclamavam que os cavalos estavam fracos, cansados, magros e pouco ajudavam nas plantações. Sem a ajuda desses bichos, a agricultura europeia recebeu um golpe fatal. Nos anos seguintes, o continente amargou uma grande fome. Na Alemanha, a falta de animais, somada ao bloqueio das nações aliadas, matou 763 000 pessoas, de acordo com estimativas oficiais. Na Rússia, cerca de 5 milhões de pessoas foram atingidas pela grande fome de 1921.
Mobilização equina – Os cavalos começaram a ser recrutados no início da guerra, junto com os soldados. Na França, uma lei de 1877 permitia que o governo tomasse os animais para servir em conflitos. Assim, em agosto de 1914, 730 000 cavalos franceses, um em cada quatro no país, marcharam para as trincheiras. A França contou ainda com 20 000 animais vindos da Argélia e mais 30 000 importados de outros lugares. “No campo, desapareceram, ao mesmo tempo, homens e cavalos”, afirma a historiadora Gene Tempest, pesquisadora da Universidade Yale, nos Estados Unidos. “Isso fez com que a agricultura ficasse paralisada em 1914: a partida dessas duas forças de trabalho foi difícil de superar.”
Gene conduziu um estudo de quatro anos sobre a presença dos cavalos nos exércitos britânicos e franceses na I Guerra Mundial. Vasculhou arquivos dos dois países e descobriu que os bichos eram muito mais numerosos nas batalhas do que se imaginava. “Devemos pensar na I Guerra Mundial como um conflito equestre. Sua força tornou possível a vida e os combates diários. Cavalos foram os principais motores da guerra”, afirma.
No início dos combates, os equinos retirados das fazendas, indústrias e pequenos sítios eram colocados nas linhas de frente — uma herança das guerras do século 19, apoiadas em colunas poderosas de cavaleiros. Com o desenvolvimento de armamentos mais precisos, os generais perceberam que os cavalos pouco ajudavam no front. Por serem grandes demais, tornavam-se alvos fáceis para tiros e bombas.
A cavalaria seria importante até o fim do conflito em batalhas no Oriente Médio e no leste da Europa. Mas, no oeste do continente, seu papel essencial era o de meio de transporte. Noventa por cento dos animais eram usados para carregar os canhões até a linha de tiro, transportar soldados, alimentos, armas, munições e correspondências. Eles carregavam os mortos após as batalhas e serviam como veículo silencioso para espionar tropas inimigas. Registros de combates, como fotos e diários, mostram que são poucos os acampamentos sem a presença de cavalos. “É um mito imaginar que, como a cavalaria desapareceu, os cavalos também estiveram ausente das guerras. Eles permaneceram absolutamente essenciais para todas as batalhas da primeira metade do século XX”, diz Gene.
A razão da larga utilização desses animais é que eles se davam muito melhor em ambientes frios e lamacentos — como as trincheiras — do que carros e caminhões. Na década de 1910, os cavalos eram mais disponíveis e baratos do que os motores. Além disso, a maior parte dos homens que lutaram na guerra estava acostumada a conduzir cavalos, enquanto eram raros os que sabiam dirigir caminhões e tanques.
Cavalo equipado com metralhadora.
Morte no front — Estar longe das balas e minas, entretanto, não evitou o massacre dos animais. Como os soldados, eles morreram aos milhões. O serviço veterinário de guerra francês contabilizou, durante os quatro anos de guerra, 6,5 milhões de atendimentos aos cavalos — o que significa que cada um entrou nas enfermarias em torno de sete vezes. Para substituir essa força de trabalho tirada de circulação, os exércitos organizavam missões para a compra de animais ao redor do mundo. Os britânicos importaram 700 000 dos americanos e 5 000 dos uruguaios. A França comprou 500 000 dos Estados Unidos e outros 70 000 da Argentina. “No início do conflito, França e Inglaterra esperavam adquirir ainda mais dos países da América do Sul. No entanto, a biologia dos animais interveio a seu favor. Eles não suportavam muito bem a mudança de estação e a viagem era mais longa que dos Estados Unidos para a Europa”, explica Gene.
A França gastou 139 milhões de dólares no comércio equino com os Estados Unidos, enquanto os ingleses pagaram 337,5 milhões de dólares. Comparado ao preço dos animais europeus, os americanos eram bem mais baratos. “Era politicamente menos custoso comprar animais de fora do que pedir à população europeia que sacrificasse os seus”, diz a historiadora.
O número poderia ter sido maior, se os cavalos importados não fossem, em sua maioria, considerados selvagens pelos europeus. Relatos de soldados franceses mostram que era preciso domar os animais e ensiná-los a enfrentar os horrores da guerra antes que eles pudessem ser usados.
Além do número de bichos que diminuía, as tropas precisaram lidar ainda com outro problema: a alimentação. Em 1917, eram necessárias 3 750 toneladas de aveia diárias para suprir as necessidades dos animais. Desse total, 70% vinham dos Estados Unidos, que diminuíram as exportações devido ao alto preço do frete. Ver os cavalos famintos, sem forças para os combates e, muitas vezes, morrendo de inanição, significava um forte abalo emocional para os soldados. Para alguns, a perda dos animais inocentes era um trauma a mais, somado à morte inútil de milhões de companheiros entre balas, minas e o arame farpado que cobria as trincheiras.
A história dos cavalos na Primeira Guerra Mundial ainda é desconhecida do grande público. Mas, recentemente, foi possível descobrir um pouco mais sobre ela com o filme do diretor ameri-cano Steven Spielberg, “Cavalo de Guerra”, lançado em 2012. A sinopse do filme: Ted Narracot (Peter Mullan) é um camponês destemido e ex-herói de guerra. Com problemas de saúde e bebedeiras, batalha junto com a esposa Rose (Emily Watson) e o filho Albert (Jeremy Irvine) para sobreviver numa fazenda alugada, propriedade de um milionário sem escrúpulos (David Tewlis). Cansado da arrogância do senhorio, decide enfrentá-lo em um leilão e acaba comprando um ca-valo inadequado para os serviços de aragem nas suas terras. O que ele não sabia era que seu filho estabeleceria com o animal um conexão jamais imaginada. Batizado de Joey pelo jovem, os dois começam seus treinamentos e desenvolvem aptidões, mas a 1ª Guerra Mundial chegou e a cavalaria britânica o leva embora, sem que Albert possa se alistar por não ter idade suficiente. Já nos campos de batalha e durante anos, Joey mostra toda a sua força e determinação, passando por diversas situações de perigo e donos diferentes, mas o destino reservava para ele um final surpreendente. Clique aqui e veja o trailer.
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