1 de jul. de 2013 | By: Fabrício

Vicissitudes 13

“É melhor atirar-se à luta em busca de dias melhores, mesmo correndo o risco de perder tudo, do que permanecer estático, como os pobres de espírito, que não lutam, mas também não vencem, que não conhecem a dor da derrota, nem a glória de ressurgir dos escombros. Esses pobres de espírito, ao final de sua jornada na Terra não agradecem a Deus por terem vivido, mas desculpam-se perante Ele, por terem apenas passado pela vida”.
BOB MARLEY

Desde o início do recebimento da notícia que a Copa do Mundo de 2014 e a Olimpíada de 2016 seriam realizadas no Brasil é que venho pensando quantos bilhões de nosso dinheiro público seriam gastos e quantos políticos e empresários iriam enriquecer e se beneficiar com tais eventos.

Um dos principais argumentos para que a Copa e a Olimpíada aconteçam no Brasil é do legado que esses eventos teoricamente iriam deixar ao nosso país, já que estamos presenciando de perto a falência de nossa infraestrutura em diversos aspectos. Portos defasados, estradas e rodovias precárias, aeroportos que necessitam de ampliação, investimento em ferrovias, hospitais à beira da falência, melhorias no sistema de transporte público... Entre outros aspectos que todo bom brasileiro já conhece.
Em vista disso, é que fico indignado quando vejo que bilhões estão sendo investidos para a construção e reforma de estádios para a Copa do Mundo enquanto o povo brasileiro tende a sobreviver em meio ao caos que nossa sociedade apresenta, como saúde, educação e segurança pública problemática. Mas e o então prometido legado que esses eventos eram pra deixar em nosso país? Infelizmente mais uma vez entra para o rol de promessas que todos nós já estamos acostumados a ouvir.

Contraste de paisagem brasileira. Enquanto há milhões investidos na reforma no estádio do Maracanã, não há investimento nas regiões periféricas da cidade.
Mas será que precisamos desses eventos para melhorar nossa infraestrutura? Afinal, o que os municípios, os estados e o governo federal fazem com todo o montante que arrecadam com os nossos impostos? Para se ter uma ideia, 34% do PIB brasileiro são de impostos, uma vez que a média de toda América Latina gira em torno de 17,5%. Como se não bastasse há ainda o dinheiro dos Royalties do petróleo que os estados produtores dispõem. Será que não são suficientes? Ao meu entender são mais que suficientes, o problema é que toda essa soma é má gerida quando não desviada para o bolso de muitos políticos e empresários inescrupulosos.
É certo que nossos legisladores são omissos, não governam para o povo.  O que vivemos é uma crise de representatividade. Uma vez eleitos, preocupam-se apenas consigo mesmo, logo, governam em benefício próprio. Essa forma de agir acontece em todas as esferas de nossa federação. Para piorar e legitimar ações como essas existe a impunidade que faz com que a corrupção se torne um ciclo vicioso no Brasil. Mas e o povo diante de tal conjuntura, como fica?
O povo infelizmente fica a mercê desses legisladores que se utilizam de políticas sociais paliativas e promovem eventos grandiosos a fim de fazer com que a sociedade, mesmo que momentaneamente pare de se queixar e que perdure em sua zona de conforto. É a famosa política do pão e circo dos tempos modernos.

Para nós contemporâneos o circo que enquanto brasileiros temos, não são os espetáculos de gladiadores como que acontecia na Roma Antiga, mas sim o nosso futebol, que aliena boa parte dos brasileiros, pois dão mais valor ao seu time do coração ou à seleção brasileira que para as questões políticas e sociais do país. Mas o que seria então a política do pão na nossa sociedade atual? A resposta é óbvia, o programa federal Bolsa Família.

Na sociedade romana da antiguidade, o trigo era distribuído se muito a 0,5% da população total do Império. Assim, é quase tão verossímil pensar que esse trigo mantinha o povo alimentado quanto pensar que o salário-família concedido pelo Estado brasileiro possibilite aos pais e mães trabalhadores criarem e alimentarem seus filhos.

Infelizmente ainda há uma boa parcela de nossa sociedade que se encontra na linha da pobreza ou abaixo dela e que necessitam de ajuda urgente. Entretanto, não dá para viver do assistencialismo pelo resto da vida, pois programas como esse, além de servirem como medidas paliativas servem também para manter atrelada essa parcela de nossa população ao governo federal e acima de tudo, como um grande garantidor de votos em futuras eleições.

Quero deixar claro que não sou contra o Bolsa Família ou qualquer outra política assistencialista. O que se intenta criticar é o objetivo da gestão pública, que ao que se percebe através desses programas se faz passar por competente e auspicioso. Tais políticas seriam mais eficientes se fossem associados com um investimento maciço em educação, saúde e aperfeiçoamento da mão de obra, pois de nada adianta obrigar as pessoas irem à escola, se não há estrutura e/ou professores idôneos a formarem uma consciência política nos alunos ou mesmo a prepará-los para o mercado de trabalho.

Entretanto, o curioso é se perguntar por qual motivo no Brasil, os gestores públicos governam, com as condições ora expostas, e só agora há uma sinalização de movimento de subversão das massas?

Ao contrário do que se pensava que a sociedade brasileira fosse omissa, alienada ou leniente, tal concepção veio abaixo com a ocupação e efervescência da sociedade nas ruas. A verdade é que o povo – independente da classe social, idade, religião ou opção sexual – se cansou dos abusos cometidos por nossos legisladores. Não dá mais para ficarmos como meros espectadores e assistirmos os excessos cometidos por essa corja que finge nos representar.

Há muito tempo apontamos a necessidade de o Brasil mudar seus rumos, tanto na sua política econômica, que começa a dar sinais de esgotamento, como também nas prioridades dos gastos públicos. Essa degradação gera uma legítima indignação na sociedade e descrédito dos entes políticos e fez desencadear pelas ruas de nosso país manifestações populares polissêmicas, em virtude do alto grau do descontentamento da nação.
Diante desse cenário que se instalou e que ganhou as ruas, é indubitável pensar que dentro de nosso processo democrático, só o voto já não basta mais, ou seja, precisávamos fazer algo a mais. Isso está evidente, pois desde o nosso processo de redemocratização continuou haver corrupção em nosso cenário político e falta de representatividade. Já era hora de dar uma basta.

Quando vejo uma multidão sair às ruas e reivindicar pacificamente mudanças e melhorias para nosso país, percebo que finalmente chegou a nossa vez, de enquanto cidadãos fazer valer nosso direito democrático. Nesse contexto quero destacar o filósofo inglês John Locke (1632-1704) que em pleno século XVII, já dizia que as pessoas podiam e deveriam contestar um governo injusto já que não eram obrigadas a aceitar suas decisões arbitrarias. Partindo desse princípio temos, portanto, o direito e o dever de lutar por melhorias, cobrar de nossos legisladores e exigir mudanças quando estes não governam em prol da população.

Não existe mais nenhuma ideologia política por trás dos partidos. O que há são interesses. A fim de se garantirem e perpetuarem  no poder fazem qualquer aliança política e se sujeitam à qualquer prática. Prova disso, é que as manifestações políticas no Brasil desprezam a participação dos partidos políticos, uma vez que estes estão diretamente envolvidos na maior parte dos escândalos que gera manifestação pública.

Independente do rumo que a político no Brasil irá tomar daqui pra frente, nossa sociedade mais uma vez marcou história. Há que se pensar que saímos do estado de torpor que estávamos e que nossos legisladores já entenderam nosso recado. Quero acreditar que tais manifestações não são passageiras, pois só assim, nós, enquanto sociedade teremos uma maior participação nas decisões políticas do país. Além disso, espero que diante de tal conjuntura que se configurou, esse movimento tenha profunda repercussão nas eleições do próximo ano (2014).

Porém, nunca é demais lembrar que as verdadeiras mudanças que a sociedade exige e o país necessita só acontecerão com o fortalecimento do processo democrático. E claro, sem violência e degradação do patrimônio público, pagos com o dinheiro do contribuinte.
Da mesma forma, qualquer manifestação não articulada apenas cria expectativas que talvez estejam mais próximas da frustração do que da realidade. A união do povo é essencial no processo de mudança do pensamento da sociedade e, consequentemente, da história do nosso país.

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